Harry Potter e Ciência: Analisando Equiparações



No universo de Harry Potter, a magia desempenha uma parte central da narrativa. Ao explorarmos o misticismo permeado nas páginas, todavia, deparamo-nos com um enredo repleto de nuances de cotidianidade. Para além de encantos, criaturas míticas e paisagens feéricas, a série pode revelar uma inusitada interseção com os aspectos científicos da nossa realidade. Desde preparações cuidadosas de compostos solutos a enigmas temporais, a história criada por J.K. Rowling é uma demonstração envolvente de como o sortilégio e a ciência podem coexistir.


Poção e Química

A disciplina de Poções é uma das mais fascinantes em Hogwarts. Ela ensina a habilidade de criar misturas mágicas com efeitos variados. Muitos dos princípios por trás da criação dos elixires fictícios lembram paralelos com a química do mundo real. Um exemplo é a Poção Polissuco, que permite que um bruxo se transforme temporariamente em outro. Requer uma infinidade de propriedades específicas e etapas de preparação meticulosas, lembrando-nos das reações químicas intricadas que podem levar a conversões do estado da matéria. Assim como em um procedimento químico, a precisão e o conhecimento assertivo dos “ingredimágicos” são primordiais para o êxito na fabricação de bálsamos enfeitiçados. 

Outra ligação interessante é a Poção Wolfsbane, projetada para permitir que Remo Lupin sustenha o domínio sobre si durante a transformação em lobisomem. Ela não cura a maldição licantrópica, mas ajuda a tornar o processo de mutação menos perigoso. Por outro lado, a administração dos antirretrovirais é uma estratégia para controlar a replicação do vírus HIV no corpo, reduzindo as chances de contrair a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Os pontos em comum estão na ideia de que ambos os “medicamentos” contribuem para preservar o sistema imunológico e a qualidade de vida de alguém que enfrenta uma condição crônica ou anátema aparentemente incurável. Cada qual dos “tratamentos” têm como propósito permitir que a pessoa afetada mantenha uma vida normal, apesar da condição. 

As atividades em Poções são atulhadas de instruções características. O estudo da compatibilidade entre componentes e a ordem em que devem ser adicionados, bem como a atenção à temperatura e ao tempo, ressoam as nossas técnicas laboratoriais.



Astronomia e Astrologia 

As aulas de Astronomia são uma parte importante do currículo escolar dos bruxos. Elas ocorrem na imponente Torre de Astronomia, uma estrutura elevada que se projeta majestosamente sobre os terrenos da Escola de Magia e Bruxaria. A responsável é a professor Aurora Sinistra, cujo nome reflete a índole misteriosa e cósmica da matéria que leciona. Os alunos têm a oportunidade de se aventurar nas noites consteladas e adentrar nos segredos dos céus noturnos. A principal atividade é a observação dos corpos celestes utilizando telescópios para examinar as estrelas, planetas e os demais astros que pontuam o firmamento. A região oferece uma vista desobstruída, o que permite que os jovens explorem o universo mágico em expansão. 

Essa disciplina também é onde bruxos astrônomos usam informações que coletam para orientar seus estudos em outros campos, como Aritmância e Adivinhação. Aritmância utiliza dados celestes e padrões numéricos emergentes para fazer previsões sobre ocasiões futuras por meio da numerologia, enquanto Adivinhação usa compreensões similares para ensinar métodos para adivinhar ou coletar insights sobre eventos subsequentes. 

Além das investigações siderais aproximadas entre os dois mundos, diversos nomes da saga tiveram inspirações em conceituação astronômica: Draco, a 8ª maior constelação, próxima à estrela do norte, apresenta uma configuração que se assemelha a uma “cobra”; Andrômeda, um constelado esplendoroso, abriga a galáxia andrômeda, situada a 2.6 anos-luz de nossa Galáxia Via Láctea; Belatrix, a 3ª estrela mais brilhante na constelação de Orion, se sobressai como sendo três vezes mais quente que o nosso Sol. E, finalmente, Sirius, a estrela mais reluzente no céu noturno, habita na constelação “Canis Major”, traduzida como “grande cão” do latim. 



Transfiguração e Teoria das Cordas

A Transfiguração é um ramo hogwartsiano que ensina a arte de mudar o arranjo de certas especificidades. Esta capacitação, muitas vezes vinculada à feitiçaria complexa, pode surpreendentemente ter associações com os princípios que regem nosso Cosmo, exemplificados pela Teoria das Cordas. Esta hipótese físico-teórica especula que as partículas fundamentais do universo não existiriam em pontos de dimensão, mas sim, “minúsculas cordas” vibrantes. Estes “fios” unidimensionais frementes seriam a base de todos elementares e suas distintas vibrações corresponderiam a partículas diferentes, como elétrons e quarks. 

Uma possível correlação estaria no fato de que, na Transfiguração, os bruxos estão, de certa forma, manipulando o núcleo dos objetos a fim de transformá-los em algo completamente divergente. Essa manipulação do “cerne” de um apetrecho pode ser interpretada como um domínio magical das “cordas” que compõem a matéria. Em termos de analogia, podemos imaginar uma transfiguradora como uma “cientista de partículas mágica” que, em vez de atentar com as cordas do universo, trabalha com o âmago mágico dos itens, podendo usar encantamentos para alterar a pulsação ou a natureza dessas essências, o que resulta na transmutação de um artefato em outro. 

Ainda que as alterações materiais representem tecnicamente modificações químicas em restantes fundamentos por meio de interações moleculares, a Transfiguração emerge como uma equiparação razoável no contexto da Teoria das Cordas, desde que não consideremos as unificações entre relatividade e quântica.



Vira-Tempo e Paradoxo Bootstrap 

Vira-Tempo é um artefato potterista que concede ao portador voltar no tempo. O Paradoxo de Bootstrap, no que lhe concerne, é uma complexidade na tese de viagem no tempo que aborda situações nas quais o encadeamento aparenta se autorregenerar. Na perspectiva fílmica de Prisioneiro de Azkaban, Hermione usa o Vira-Tempo para participar de aulas adicionais, criando um tipo de ciclo em que eventos futuros dependem das ações do passado, que, por sua vez, são influenciadas por acontecimentos sequentes. Isso cria um loop de causalidade, onde discernir a sequência cronológica torna-se desafiador. 

O paradoxo apresenta-se quando consideramos que, sem a interferência de Hermione (que usa o Vira-Tempo para resgatar Sirius Black e Buckbeak da execução), esses incidentes não teriam ocorrido da maneira como decorreram? Ou, se eles tivessem intercorrido, Hermione não teria tido motivos para usar o Vira-Tempo para resgatá-los? A situação do Expecto Patronum lançado por Harry segue um dilema similar: inicialmente, ele supõe que seu pai tinha conjurado para protegê-los, mas uma reviravolta na trama evidenciou que, na verdade, Harry era o responsável o tempo todo. Ao explicar a Hermione como realizou esse feito, Harry afirmou que testemunhou a si (sua versão futura) efetuando o feitiço e aprendeu com a observação. 

Em uma explicação simplificada, é como se o feitiço já tivesse sido invocado, independente das ações dos Harry. Não existe uma ocasião específica na temporalidade, porque um Harry precisou do outro para alcançar o objetivo final. Contrário ao paradoxo do avô, o paradoxo de Bootstrap tem uma solução autoconsistente.



Aparatação e Entrelaçamento Quântico

Aparatação e entrelaçamento quântico são dois conceitos que compartilham semelhanças em termos de propriedades instantâneas e interconexões entre locais distantes. Aparatação, como retratada na série Harry Potter, é a capacidade de conjuradores se deslocarem instantaneamente de uma localidade à outra. Essa expertise mágica impele as leis da física convencional, permitindo que um bruxo teleporte de um ponto e reapareça em outro, desafiando as normas do território embruxado. 

O entrelaçamento quântico, contudo, é um fenômeno da física quântica que envolve partículas subatômicas, como elétrons ou prótons. Quando duas dessas partículas estão entrelaçadas, partilham atributos de modo que a alteração do estado de uma partícula afeta prontamente o estado da outra, não importando a longitude que as separa. Isso contradiz o entendimento de que informações ou influências não podem se propagar a velocidades superiores à da luz, conforme estabelecido pela teoria da relatividade de Albert Einstein. 

O emaranhamento quantum é uma característica intrigante, com implicações significativas para áreas como a computação quântica e a criptografia. Tanto o conceito ficcional quanto o real destacam a noção de conexões súbitas e interações entre objetos ou lugares longínquos, contrariando as instruções tradicionais de espaço e tempo. Eles fornecem demonstrativos atraentes de como o mundo quimérico e os mistérios da realidade tangível podem convergir em conceituações aparentemente correlativas.



Lumos e Emissão de Luz 

O feitiço Lumos, amplamente empregado por bruxos para conjurar luz a partir de suas varinhas, estabelece uma curiosa relação com o processo de retransmissão de fótons. Na Óptica, a luz se origina quando átomos ou moléculas são estimulados a alcançar níveis energéticos mais elevados, e, ao retornarem aos estados mais baixos, emitem fótons fulgentes, criando deste modo a claridade que percebemos. 

Na versão cinematográfica de Pedra Filosofal, Hermione utiliza o Lumos Solem para salvar Ron do Visgo-Do-Diabo, desencadeando a emissão de radiância intensa, abrangendo todo o espectro visível dos membros tentaculosos. As várias exalações do Lumos são como diferentes manifestações de luminosidade: a intensidade do Lumos Maxima reflete a durabilidade intrínseca da fotoluminescência, enquanto o Lumos Duo assemelha-se à duplicidade de luminescência. 

Ao analisar uma varinha na esfera muggle, podemos comparar seu funcionamento com o das lâmpadas térmicas. Quando um fio ardescente de Volframio em uma lâmpada é exposto a altas temperaturas, ele se degrada rapidamente na presença de comburente. Portanto, é alojado numa fonte luminosa isenta de oxigênio. 

Com isso, a extremidade da varinha poderia, teoricamente, produzir luz, mas quando exposta a um ambiente com oxigênio, resultaria em uma ignição e anulação abrupta, o que se agravaria pelo fato do artefato ser fabricado em madeira, um aparato menos resistente do que o Elemento 74, comumente utilizado no filamento em dispositivos incandescentes. Entretanto, considerando que cada varinha possui um núcleo de encantação, é provável que, uma vez existindo, superaria facilmente quaisquer elementos da nossa tabela periódica.



Animagus e Metamorfose 

Em Harry Potter, animagus é um ser que possui a capacidade de se transformar em um animal que alude sua personalidade, ao passo que permanece com sua mente, mantendo sua inteligência, recordações e controle próprio. Ao transmutar-se, uma expressiva reestruturação anatômica resulta numa visagem absolutamente discrepante. 

Em contrapartida, na biologia, metamorfose refere-se a um processo de desenvolvimento em que alguns organismos passam por mudanças em sua estruturação corporal durante vários momentos no ciclo de vida. Isso é comum em insetos holometábolos, que passam por comutação, incluindo etapas de larva, pupa e adulto, como observado nas mariposas. 

O paralelismo se encontra na transição de composição: os dois envolvem alterações somáticas almejando tornar-se outro espécime, mas por meios e fins contrastantes. Enquanto a transformação em um animal é feita pelo pensar de um bruxo, a metamorfose biológica é um processo programado geneticamente que ocorre em resposta a estímulos ambientais ou estágios de desdobramentos. 

Adicionalmente, segundo dados da Science ABC, borboletas armazenam lembranças de seus dias como lagartas por meio de estruturas cerebrais associadas ao aprendizado e ao sabor retido ao longo do holometabolismo — o que conflui com as reminiscências dos animagus, mesmo que de maneira limitada.



Expecto Patronum e Profissionais de Saúde 

No livro Relíquias da Morte, o ar pestilento e gélido circunda Harry, Hermione e Ron, enquanto seres obscuros os perseguem como sombras famintas à espreita, prontas para devorar a última centelha de esperança. Eram os Dementadores, sugadores de alegria dos seres mágicos, envolvendo-os em um profundo estado de tristeza. Essas criaturas malignas são frequentemente vistas como uma representação vívida da escuridão emocional por provocar sentimentos depressivos em suas vítimas. O enfrentamento contra essas entidades tenebrosas é conduzido através do Expecto Patronum, um encanto que convoca um guardião animálio a partir de uma lembrança feliz. Este feitiçal repele pensamentos negativos, restaurando o otimismo para aqueles que o conjuram, simbolizando o poder resiliente de uma recordação luminosa. 

Em nossa Terra, profissionais de saúde exercem um papel crucial no combate à depressão, assim como o patrono protetor ajuda a enfrentar os devoradores de felicidade. Eles oferecem apoio, tratamento e orientação para aqueles que lutam contra transtornos mentais, ajudando-os a recuperar a esperança e o bem-estar. Da mesma forma que o Patronum é uma representação da força interior de um bruxo, os prestadores de serviços de saúde capacitam seus pacientes a encontrar sua resiliência individual. 

A figura do Dementador mostra-se como uma metáfora poderosíssima no enredo de Harry Potter. A autora J.K. Rowling, ao concebê-los em um período desafiador de sua vida, infundiu nessas terríveis abominações um simbolismo que ultrapassa um mero recurso de antagonismo narrativo, tornando-as personificações vívidas de seus próprios temores e superações.
 



Referências

I. Jones, A. Z., & Robbins, D. (2010). String Theory For Dummies. John Wiley & Son.


II. Thirumalai, J. (2016). Luminescence - An Outlook on the Phenomena and their Applications. IntechOpen.


III. Randall, L. (2011). Knocking on Heaven's Door: How Physics and Scientific Thinking Illuminate the Universe and the Modern World. Ecco Press.